Uma carreira frutífera e uma discografia mais confusa que a série Evil Dead concluem em um show explosivo, de pura simpatia e entrega. Enquanto a platéia flana entre momentos de epilepsia e balanços singelos, todos os integrantes da banda estão extremamente concentrados em seus acordes nervosos, solos e mini-solos virtuosos, viradas tortas e grunhidos afinados. E QUE SOM. E QUE SHOWS. Para exemplificar, recursos audivovisuais:
No Beco
Na Virada
Uma virtuose aleatória muito maneira:
Eles conseguem ir de uma extremidade à outra de todas as possibilidades do que se pode ser feito sobre um palco com duas guitarras, um baixo e uma bateria. Ouso dizer que o único show que pode ser considerado equivalente a esse foi o do Dinosaur Jr. no mesmo Beco (que ainda era o Comitê Club) em Setembro de 2010. Sentiu o drama, vagabundo?
Dito isso, um fator me pareceu bastante estranho: onde estavam os indies roqueiros de São Paulo naquela madrugada de quinta-feira no Beco SP - e bota madrugada nisso, o show foi começar lá pelas 2h da manhã...de fuder o assalariado - e naquela manhã de domingo no Palco da São João - e bota manhã nisso, o show começou pontualmente as 7h...de fuder o assalariado - na Virada Cultura? Acho que show do Beco tinham, no máximo, umas 50 pessoas.
Tudo bem, teve show do Ting Tings, Duran Duran, TuNe_YaRdS e Virada Cultural numa mesma semana, difícil o bolso e o fígado acompanharem tudo isso acontecendo, teríamos que priorizar. Mas por que o White Denim, que me parece a banda mais interessante dentro as opções acima (tirando a Virada, que é de graça e gigantossáurica), foi veementemente ignorada?
Fiquei com uma ligeria impressão que os indies paulistanos preferem mais uma bela boca livre do que um bom show.
Não compartilho desse esnobismo nostálgico de quem ficou surpreso quando ninguém reconheceu o cover do Fugazi, tocado pelo Tv On The Radio, mas o que me deixou confuso é o por quê privilegiar uma festa fechada, open bar, com muita GeNtE BoNiTa - termo mais detestável já criado por uma cultura lusófona - do que pagar da própria carteira por um baita show?
Eu também adoro uma boca livre, é uma delícia, mas dentro do círculo dos indies e esnobes musicais em geral essa preferência me parece, no mínimo, contraditória. Ir nessas festas em que são trazidas baitas bandas, mas que ficam renegadas à mera trilha sonora de um convescote.
E isso parte de um movimento que inunda as agências de comunicação daqui de São Paulo (não sei dos outros lugares, mas imagino que não seja muito diferente) = marcas tentando se apropriar da música pra criar uma relação ~ legítima ~ com seu suposto público.
Não é a mais impossível das cenas imaginar o job chegando em uma agência e os criativos convencendo o cliente de que aquela tal banda alternativa é a materialização musical do LIFESTYLE DOS NOSSOS CONSUMERS e tem tudo a ver com a sua marca de areia de gato/ lápis de cor/ insira seu produto aqui. E aí é feita aquela festona num lugar super coooollll exclusivissíma para poucos e bons.
E quantos shows fechados ultimamente apareceram por aqui, não? Normalmente esvaziados de quem gosta da banda (como visto no Tv on The Radio no Cine Jóia e Tokio Police Club, que eu não fui, mas ouvi relatos) e recheados de pessoas de costas pro palco.
Eu não enxergo isso como uma legítima parceria. Apropriação? Forçada, claro, mas não parceria. Não serve nem como um evento cultural relevante pra São Paulo nem como um grande acontecimento pra marca. Óbvio que existem ótimos exemplos de aproximação do público através da música, mas também existe muita preguiça e uma bela dose de covardia dos publicitários que partem pra esse caminho sem nenhum reflexão. E o pior, o único que se lasca é o fã.
O festival Cultura Inglesa, que vai trazer de graça o Franz Ferdinand e o The Horrors no Parque da Independência; aquele show minúsculo do Franz Ferdinand na The Week promovido pela Smirnoff que teve sua parcela de ingressos vendidos para o público; Os minishows do Ok Go, espalhados pela cidade propostos pela José Cuervo, são todos bons exemplos de como tornar esse tipo de ação mais inclusiva e interessante.
Marcas que trazem bandas debaixo de um contrato de exclusividade tem grandes chances de deixar de fora quem simplesmente gosta daquele som. E se os fãs daquela banda não são desejados dentro da festinha, nada mais óbvio que a marca não é relevante dentro do estilo de vida desses fãs, NÃO É MESMO?
Essa bobagem que valoriza a exclusividade e, consequentemente, a exclusão, é um legítimo tiro no pé. Tentando não ser hippie, mas já sendo, a música é uma das principais ferramentas de inclusão, que permite epifanias e catarses coletivas intensas que não devem e não podem ser limitadas à um grupelho de paulistanos bem relacionados. Óbvio que existem agências de publicidade e de relações públicas que irão conseguir escolher um público certinho, mas puta merda como existem arbitrariedades nessas escolhas.
E no Rio o pessoal do Queremos aproveita dessa onda tonta do paulistano PRIVATE, se agiliza e repassa os shows a preços razoáveis (já que os shows são no Circo Voador e eles tem uma bela estratégia pra burlar a distopia das carteirinhas de estudantes, que o MaC me ensinou como funciona) pra geral.
Resumindo, isso é tipos um apelo. Colegas publicitários, tudo bem fazer a festa fechada, com muito luxo, ouro em pó e raspadinha de champagne, mas não exijam exclusividade da banda. Deixa os caras fazerem um showzinho pra quem realmente gosta do som e só quer ter o direito de pagar do seu próprio bolso pra ver aquele pessoal se esgoelando no palco.
PS2: Pensei melhor depois de escrever esse texto e reitero a observação “difícil o bolso e o fígado acompanharem tudo isso acontecendo”. Não tá difícil, tá impossível! São Paulo tá sinistro na quantidade e qualidade de shows. Mas o apelo continua, vamos aproveitar a bela safra de shows e deixar a cena musical paulistana mais cheia, mais diversificada e mais intrusiva.
2 comentários:
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